domingo, 13 de fevereiro de 2011

Post nº 26

CONSTANTINO  -  O  IMPERADOR  ROMANO
QUE  LEGALIZOU  O  CRISTIANISMO

Constantino derrota Maxêncio na batalha da Ponte Mílvia. Tela de Pieter Lastman (1613)


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Constâncio Cloro era um jovem nobre oficial quando conheceu a modesta garçonete Helena. Muito bonita, mas de família humilde, não se sabe ao certo se ambos casaram ou se ela tornou-se sua amante, apesar de ser cristã devota. Casados ou não, passaram a viver juntos e quando ela lhe deu um filho, de nome Constantino, a relação se fortaleceu. Tempos depois separaram-se, mas Cloro continuou muito apegado ao filho e o encaminhou à carreira militar, na qual ele logo se destacou como excelente oficial. Quando Cloro foi nomeado César do Ocidente pelo imperador Diocleciano e casou com a filha do seu superior, o Augusto Maximiano, o jovem Constantino continuou servindo no Oriente, mas na primeira oportunidade foi juntar-se ao pai na Gália e tornou-se seu tenente-general.

Bravo, simpático e habilidoso, Constantino já era maduro e tinha um filho adolescente quando casou com a bela Fausta, irmã mais nova de sua madrasta e também filha do aposentado augusto Maximiano, tornando ainda mais sólida a sua aspiração à púrpura imperial. Com este objetivo em mente, ele tratou de ganhar a simpatia do povo e dos soldados, tornando-se popularíssimo no Ocidente. Em 306 foi com o pai combater uma invasão dos caledônios (escoceses) no norte da Britannia, derrotando-os e expulsando-os, mas Cloro adoeceu gravemente, morrendo em York pouco depois da vitória. Tão logo foi divulgada a notícia do falecimento do querido imperador, as legiões britânicas aclamaram o seu não menos querido filho César do Ocidente, no que foram seguidas pelas legiões espanholas e gaulesas, mas as legiões italianas aclamaram o seu cunhado Maxêncio, filho do seu sogro, o ex-augusto Maximiano. Este, embora aposentado, passou a conspirar em favor do filho, chegando a tentar um fracassado Golpe de Estado contra o genro. Apesar do parentesco próximo, Constantino não o perdoou e, demonstrando toda a dureza do seu caráter, o prendeu e o executou. O sogro seria apenas o primeiro de uma longa lista de parentes próximos cuja deslealdade ele puniria com a morte.

Constantino ainda jovem, no início do seu reinado - 309 DC

O seu cunhado Maxêncio tinha o apoio do Senado Romano e depusera Severo, o augusto que assumira o posto do aposentado Maximiano, mas Constantino não se intimidou e, após alguns anos de contemporização, rompeu com o cunhado e marchou contra ele, que possuía um exército bem mais poderoso que o seu. Mas Constantino sempre fora muito astuto e atento ao que se passava no exército e na sociedade, não lhe passando despercebido o enorme crescimento do cristianismo apesar das ferozes perseguições dos imperadores Diocleciano e Galério. A seita dos cristãos se espalhara e agora boa parte do exército e do povo professava a sua doutrina secretamente.

Maxêncio também ainda era jovem quando foi derrotado
e morto por seu cunhado Constantino

Deve ser dito que dos quatro imperadores da época, pois Diocleciano criara a chamada “Tetrarquia” e dividira o império com três dos seus generais, Cloro fora o único que não perseguira os cristãos, pois a sua antiga esposa ou amante Helena era cristã devota, mas ele e o filho tinham continuado pagãos. Fosse como fosse, ambos gozavam da admiração dos cristãos e Constantino percebeu que se os cortejasse isto em nada incomodaria os soldados pagãos e ainda lhe traria o apoio dos soldados cristãos do exército de Maxêncio. E foi o que aconteceu, pois habilmente entusiasmou às tropas dizendo-lhes que tivera uma visão onde aparecia uma grande cruz no céu seguida da frase “com este signo vencerás”!

Constantino diz a seus soldados ter visto no céu uma mensagem convidando-o  aderir ao cristianismo

Os legionários cristãos foram tomados de grande fervor que contagiou a todos e Constantino mandou que pintassem a cruz e a frase em seus escudos. Assim, à medida que cruzava a Itália, a notícia se espalhou e o ânimo das tropas de Maxêncio baixou assustadoramente. Quando os dois exércitos se chocaram na batalha da Ponte Mílvia, os soldados cristãos desertaram ou passaram para o lado de Constantino, que obteve esmagadora vitória. Maxêncio morreu na luta e o resto do seu exército aderiu ao vencedor, que entrou em Roma sob delirantes aplausos e bajulação dos oportunistas senadores que antes haviam apoiado o seu rival. Em agradecimento pelo apoio recebido dos cristãos, baixou decreto permitindo-lhes o culto de sua religião em todas as partes do Império sob sua jurisdição e continuou sua campanha contra os rivais do Oriente, pois resolvera extinguir a “Tetrarquia” e tornar-se imperador único. O fenômeno ocorrido na Itália repetiu-se em toda parte e em poucos anos ele derrotou os adversários, unificando o império sob o seu poder.

Mas, antes que o sucesso lhe coroasse os esforços, a nova situação do Cristianismo não era sólida, pois os pagãos conspiravam e Constantino  sofria forte oposição de Licínio, imperador do Oriente que casara com uma das suas irmãs e odiava o cristianismo. Parece que a sua sina era a de guerrear os cunhados e na primeira oportunidade romperam, fazendo a guerra civil eclodir e de novo abalar o Império. Após muitas tentativas de reconciliação, Constantino pela segunda vez  esmagou um cunhado e somente o poupou devido às súplicas da irmã, que lhe implorava não deixasse os seus filhinhos órfãos. Licínio foi condenado a viver  com a família em confortável prisão domiciliar na Grécia, mas tudo indica que continuou conspirando e Constantino mandou executá-lo sumariamente em casa, indiferente ao choro dos sobrinhos pequenos e das maldições da irmã desesperada.
Depois disso tornou-se implacável e mandou executar parentes invejosos que o insultavam pela sua origem “ilegítima” e conspiravam contra ele. Resolvidas as questões políticas, voltou-se para os problemas religiosos, elevando o cristianismo da posição de “religião permitida” para o de “religião autorizada”, mas permitindo que os cultos pagãos fossem praticados livremente. Com o novo status dado à Igreja, graves dissensões dogmáticas surgiram e ele convocou os bispos para um grande Concílio na cidade de Nicéia, por ele presidido pessoalmente, pois resolvera exercer os poderes imperiais de Pontifex Maximus, decidindo matéria doutrinária, criando Dioceses e nomeando Bispos, inclusive os de Roma e de Constantinopla, no que foi seguido por seus sucessores no Oriente e que os historiadores denominaram "Césaro-Papismo". A maioria do Concílio de Nicéia, em decisão apoiada pelo imperador, declarou válido o trinitarismo dos Ortodoxos e herético o unitarismo dos Arianos; porém, tal como fizera com o paganismo, Constantino permitiu aos arianos praticarem livremente sua doutrina, a qual veio a se tornar dominante nos quarenta anos seguintes à sua morte, até a ascensão ao trono do ortodoxo Teodósio.

Batalha da Ponte Mílvia. Tela de Rafael no Vaticano (séc. XVI)
    
Pouco tempo depois do célebre Concílio, uma tragédia familiar fustigou Constantino e estarreceu a todos: o jovem príncipe herdeiro Crispo, filho do seu primeiro casamento, belo, valente e popular general, foi acusado de traição e executado! Passados poucos meses, a jovem, bela e orgulhosa imperatriz Fausta sua segunda esposa, filha do infeliz Maximiano e irmã do não menos infeliz Maxêncio, foi julgada por falsamente denunciar o seu inocente enteado Crispo de uma conspiração imaginária e também executada. Um frio de terror percorreu o Império e a velha imperatriz-mãe Helena, que era muito apegada ao neto Crispo e tinha grande amizade à nora Fausta, muito mais jovem que o marido, partiu em peregrinação à Terra Santa em busca de perdão para o filho por ter ele morto tantas pessoas da sua própria família. Lá ela mandou construir a suntuosa igreja do Santo Sepulcro, que existe até hoje. Quando voltou, morreu tranquilamente na fé que abraçara desde a juventude.

Sentindo-se às portas da morte, Constantino pediu ao seu amigo e conselheiro espiritual, o bispo ariano
Eusébio, para batizá-lo e absolvê-lo dos pecados. Tela de Rafael (séc. XVI)

Velho, doente e desgostoso com os infortúnios da sua vida particular, o ortodoxo Constantino por incrível ironia recebeu o batismo das mãos do eminente bispo ariano Eusébio, seu amigo e conselheiro espiritual. Assim, assistido por um sacerdote ariano, ortodoxo Constantino deixou a vida para ingressar na galeria dos maiores estadistas de todos os tempos. Como se a contradição o perseguisse até depois da morte, foi sucedido por Constâncio, filho da infeliz Fausta, o qual, ao contrário do pai, adotou o arianismo ao invés da ortodoxia.
          
Notas:  

   1) O conflito entre arianos e ortodoxos nos séculos IV e V, teve a mesma magnitude teológica e política do conflito entre protestantes e católicos nos séculos XVI e XVII.

   2) Os Ortodoxos julgavam o Pai, o Filho e o Espírito Santo uma única pessoa (Santíssima Trindade) e por isso Jesus não era o Filho de Deus mas o próprio Deus. Já os Arianos julgavam o Pai e o Filho pessoas autônomas, sendo o Pai superior ao Filho e devendo este prestar obediência àquele, tal como ocorre nas corretas relações entre pai e filho. Portanto Jesus não era Deus, mas o Filho de Deus, como declarado pelo próprio Jesus em diversas passagens dos Evangelhos. Em resumo: para os Ortodoxos Pai e Filho eram idênticos numa relação "substancial"  de igualdade; para os Arianos eram semelhantes numa relação "consubstancial" de subordinação.

   3) É surpreendente que tendo tanto dos Evangelhos em seu favor os Arianos tenham perdido para os Ortodoxos a disputa no Concílio de Niceia, e que gozando o eminente bispo ariano Eusébio da amizade pessoal de Constantino, tenha este aprovado a decisão do Concílio. Três séculos depois sua decisão teve funestas consequências para o Cristianismo, pois auxiliou o avassalador alastramento do Islamismo por todo o Oriente Médio e norte da África. Isto ocorreu em grande parte pela adesão em massa dos perseguidos cristãos arianos à nova religião Islâmica, graças aos pontos comuns às respectivas teologias.

   4) O ponto básico em comum era o da unicidade e supremacia de Deus. Apesar dos muçulmanos não aceitarem a doutrina ariana de ser Jesus filho de Deus, o aceitaram como enviado de Deus e lhe deram o 3º lugar de importância entre os profetas, logo após Maomé e Moisés. Deram também a Maria lugar de grande destaque no Khoran e a fizeram a mulher mais venerada do Islã. A brutal perseguição dos Cristãos Ortodoxos aos Cristãos Arianos empurrou estes para o Islamismo, dando à nova religião uma força que de outra forma ela não teria, sobretudo no fácil domínio do norte da África cuja população, quase toda Ariana, sofrera horrores no século anterior nas mãos dos Ortodoxos do imperador Justiniano. Para a conversão em massa dos Cristãos Arianos ao Islã pesou mais a natureza única de Deus do que a dupla natureza de Jesus. 



  

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