quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Post nº 13

LANCELOT  -  O  FICTÍCIO  CAVALEIRO
DO  REI  ARTHUR

Lancelot sagrado por Guinevere é ficção, pois mulheres não
sagravam cavaleiros. Tela de Edmund Leighton (séc. XIX)

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Tudo que se refere ao rei Arthur e seus cavaleiros tem origem lendária, mas boa parte está mencionado em vários poemas que circularam oralmente entre os britânicos a partir do século VI e adquiriram depois forma escrita. Todavia há vários episódios e personagens hoje famosos do chamado Ciclo de Lendas Arturianas que só aparecem nas mesmas à partir do século XII, o que fez com que pessoas que o conhecem estranhassem que o romance O Senhor dos Dragões não se referisse a personagens e fatos que são hoje clássicos nas estórias do Ciclo, tais como A Dama do Lago, A inimizade entre Arthur e Morgana, Lancelot e, finalmente, o adultério do bravo Lancelot com a rainha Guinevere.

Preliminarmente deve ser dito que o romance  O Senhor dos Dragões se baseia nas fontes britânicas mais antigas que existem sobre Arthur, a saber: o poema Gododdin, recitado oralmente no oeste da Inglaterra até adquirir forma escrita por volta do ano 600; a Historia Britonnun escrita por Nennius cerca de século e meio depois; o poema Cantos Sobre os Túmulos dos Heróis, publicado provavelmente entre 800 e 850; os Annales Cambriae, publicados entre 900 e 950; as Vidas dos Santos Galeses, publicadas entre 1000 e 1050, onde Arthur é convertido ao cristianismo por um milagre; Geraint, poema publicado ao redor de 1100; Culhwch e Olwen, poema da mesma época; e, por fim, Paredur, também publicado no final do século XI. Quando por volta de 1100 os relatos britânicos cessam, eles já contêm todos os fatos e personagens que servirão de base à história romanceada de Arthur, tal como nós a conhecemos hoje, mas deles não constam os fatos acima mencionados nem o bravo cavaleiro Lancelot.

Então, como foi que eles surgiram?

A resposta é que no século XI o príncipe francês Guilherme, duque da Normandia, invadira e ocupara a Inglaterra após matar na batalha de Hastings o rei inglês Harold, e com ele viera uma chusma de nobres franceses que se apoderou das melhores terras e cargos públicos, tornando os ingleses cidadãos de segunda classe.

Tal como Lancelot, damas misteriosas em românticos lagos são criações do romance de cavalaria e amor
cortês, não das lendas celtas sobre Arthur. Tela de John William Waterhouse (séc. XIX)

Os conquistadores eram mais cultos, refinados e tinham uma literatura bem superior, por isso os seus eruditos logo perceberam que os Contos Arturianos de origem celta eram ótima fonte para trabalhos literários de alto nível, capazes de dar fama e riqueza a quem os compilasse adequadamente. Ademais, tais obras poderiam forjar uma identidade cultural comum a conquistadores e conquistados!

A primeira e mais importante obra anglo-francesa sobre Arthur e os seus contemporâneos foi a História dos Reis da Inglaterra, escrita e publicada pelo bispo Geoffrey de Monmouth em 1135. O livro fez grande sucesso em toda a Europa, mas nem a dama do lago, nem a inimizade de Morgana com Arthur e nem o cavaleiro Lancelot são nele mencionados.

Os poemas celtas não cuidam de cavaleiros românticos, adultérios, maridos ciumentos e pais desconfiados,
temas do romance de cavalaria e amor cortês. Tela de Edmund Leighton (séc. XIX)

Lancelot só vai aparecer nas chamadas lendas arturianas algumas décadas depois através do poema em prosa Érec et Énide do poeta francês Chrétien de Troyes, fundador do gênero literário chamado Romance de Cavalaria e de Amor Cortês. O mesmo ocorre no seu romance subseqüente Cligés, mas em ambos Lancelot aparece como personagem secundário. Lancelot somente surge como personagem principal no mais famoso romance de Chrétien, Chevalier de La Charette, publicado em 1190.

É nesses poemas em prosa, a que se deu o nome de romance, que surgem as estórias da Dama do Lago, da inimizade entre Morgana e Arthur, de Lancelot, assim como do seu adultério com Guinevere, tudo bem ao gosto do novo gênero literário Romance de Cavalaria e de Amor Cortês. Por isso pode-se dizer que Lancelot e referidos episódios nada mais são do que criações romanescas do francês Chrétien de Troyes, destinadas a atender o gosto de um público ávido de aventuras galantes e sem qualquer base nos relatos celtas originais sobre Arthur.

Na verdade referidos romances apresentam Arthur como rei bonachão e marido traído tolerante,  não como valente guerreiro que trava desesperada luta contra os bárbaros no apagar das luzes do Império Romano. Romances de outros autores da época adotam a mesma postura, a qual só mudará um século depois pela mão de escritores interessados em resgatar a imagem militar de Arthur e dos seus cavaleiros, afastando as frivolidades do “Amor Cortês” e voltando às bases guerreiras genuinamente celtas da história.

Apesar de ser uma obra de ficção, O Senhor dos Dragões não poderia se referir a fatos e personagens que nem sequer existiam na memória dos celtas que, com patriotismo, fé e imaginação, conservaram em poemas orais a maravilhosa saga arturiana para delícia das gerações futuras.



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